Frei Vanildo Luiz Zugno OFMcap
Comer é um ato biológico. Nosso corpo precisa ser provido dos nutrientes necessários para permanecer vivo. Se não comemos, morremos. Por isso a fome é algo tão terrível. Ela é a antessala da morte. A pessoa que está com fome, para comer, ou seja, para sobreviver, é capaz de qualquer coisa: trapacear, roubar e, no limite, até matar.
Mas, comer, é também um ato social. Amostra disto é afirmação de que, mais importante do que comemos, é com quem comemos. Como diz a Bíblia no Livro dos Provérbios, “é melhor comer um prato de hortaliças, onde há amor, do que ter um boi gordo acompanhado de ódio na refeição”. A forma como são produzidos, intercambiados e consumidos os alimentos revelam a verdadeira natureza de uma sociedade.
A comida, por ser indispensável para a sobrevivência e por ser símbolo de relações sociais, é um elemento presente em todas as religiões, inclusive no cristianismo. Nos Evangelhos, há mais comida e refeições do que milagres e exorcismos. Se tomamos, por exemplo, o Evangelho de João, a obra do Salvador começa com uma festa de casamento em Caná onde ele transforma a água em vinho e termina com um encontro do Ressuscitado com os discípulos à beira do lago onde Jesus partilha pão e peixe assado com seus amigos e amigas.
Partilha de comida e bebida que, durante o percurso da Galileia até Jerusalém, Jesus já havia feito em muitos lugares e com muitas pessoas. Na casa de pobres e de ricos, de santos e de pecadores, de homens e de mulheres, de judeus e de estrangeiros. Às vezes comendo e bebendo muito, a ponto de dizerem que era um comilão e um beberrão. Outras vezes, comendo as sobras ou o quase nada do que as pessoas tinham. E, em algumas situações, até roubando o trigo da beira da estrada para poder saciar a fome dos discípulos.
Mas acima de tudo e em todas as ocasiões, ensinando que a comida deve ser partilhada sem que ninguém fique de fora. Quando os discípulos, vendo a multidão com fome, pedem que o Mestre mande todos embora para que cada um se vire como pode, Jesus ensina que a partilha é o caminho para que todos fiquem saciados. E dos cinco pães e dois peixes nasce a consciência e a prática de que, para que todos comam, é preciso que os que tem muito partilhem com os que pouco ou nada têm.
No tempo de Jesus, assim como hoje, o problema não é a falta de comida. É a falta de partilha. No mundo, há comida de sobra. No caso do Brasil, somos o maior exportador mundial de alimentos. E, mesmo assim, há gente passando fome…
Como dizia o Papa João Paulo II na Inauguração da Primeira Conferência da ONU sobre alimentação no ano de 1992, vivemos o “paradoxo da abundância”: há alimento para todos, mas nem todos podem comer.
Precisamos de novo, aprender com Jesus: que a partilha do pão, do peixe, do vinho, da alegria e da mesa aberta para todos e todas, nos ajude a matar a fome de comida e o anseio por uma nova e justa sociedade.