Sob ataque dos setores conservadores e desabrigada de políticas públicas de economia solidária, a feira de Santa Maria aposta na força popular para seguir fazendo história
Se nos últimos anos – quando o neoliberalismo em sua versão mais selvagem voltou a escalar as instâncias de poder – já foi um desafio manter a Feira Internacional de Cooperativismo e Economia Solidária em pé, esta 26ª edição que vai acontecer entre os dias 11 e 14 de julho em Santa Maria está se tornando um verdadeiro sinônimo da palavra “resistência”. Porém se alguém apostava em sufocar o maior evento de ecosol da América Latina e silenciar o legado do saudoso Dom Ivo Lorscheider – idealizador do evento -, não contava com a obstinação do grupo de voluntários capitaneados pela incansável Irmã Lourdes Dill e todas as manifestações de apoio e solidariedade que estão formando uma corrente onde se propõe concretamente a “ninguém soltar a mão de ninguém” e assim manter viva a semente do Fórum Social Mundial que foi plantada na região central, em pleno coração do RS.
Irmã Lourdes relembra que a Feicoop “é um grande espaço de articulação, debate, comercialização justa e troca de experiências entre os empreendimentos da economia solidária”. A religiosa e ativista social destaca a participação de iniciativas da agricultura familiar camponesa, reforma agrária, agroecologia, associações de catadores e catadoras, povos indígenas e tradicionais, organizações populares, associações, cooperativas, empreendimentos solidários”, num ambiente onde impera o espírito da participação. “Aqui vamos muito além da resistência frente à exclusão social e o desemprego, procurando apontar aponta para uma nova prática econômica, para a reinvenção do nosso sentido de coletividade, para a superação desse sistema que aí está”, reflete. Para ela, essa nova construção deve se constituir a partir do trabalho cooperativado, auto gestionário, com gestão participativa entre homens e mulheres que constroem o bem viver”, completa.
No ano passado 302 mil pessoas prestigiaram o evento, que contou com a representação de 3,5 mil empreendimentos organizados em rede, 583 municípios, 26 estados brasileiros e Distrito Federal, e pelo menos 25 países. Presença constante nas edições da Feicoop, o deputado estadual constituinte (1987-1990) Selvino Heck relembra um provérbio africano que vem sendo repetido a cada ano pela coordenadora do evento: “Gente simples, fazendo coisas pequenas, em lugares pouto importantes, consegue mudanças extraordinárias”. Para ele, “a economia solidária é um destes espaços onde a gente simples reúne-se em grupos, em cooperativas, em associações, em feiras e comunidades. Planta sementes de vida todos os dias. Constrói o novo e a esperança. Especialmente nestes tempos em que vicejam o ódio, a intolerância, o individualismo, a ganância e o lucro desmedidos”.
Durante a Feicoop ocorrem práticas do comércio justo e consumo ético e solidário, trocas solidárias com moeda social e atividades de formação e interação. Os produtos oferecidos na Feira são de procedência ecológica. A organização do evento trabalha com a teoria e a prática, articulando campo, cidade e as diferentes culturas e etnias. São expostos para comercialização na Feira cerca de 10 mil produtos, entre agroindústria familiar, artesanato, alimentação, hortifrutigranjeiros, plantas ornamentais, serviços e produtos de povos indígenas.
O ex-governador Olívio Dutra é outro que se soma às vozes que apoiam e valorizam o evento ao longo dos anos tem trazido reconhecimento à Santa Maria e ao estado do Rio Grande do Sul em nível nacional e internacional: “A Feicoop é uma iniciativa que instiga a cidadania, de construção pela base de uma democracia que não seja apenas no discurso ou na letra da lei, mas que seja vivida e fluída por milhares de pessoas”. Quanto ao desafio da gestão da feira de agregar forças em diversas instâncias para além dos governos Estadual e Federal que omitem-se em estar presentes ao evento, desafia: “Nós devemos assumir o nosso papel de sujeitos e não objetos da política, e garantir que movimentos e ideias como estas jamais feneçam, ao contrário, se fortaleçam, criando um fio de solidariedade que se estenda e não se rompa nunca”.
O QUE É ECONOMIA SOLIDÁRIA? É um jeito diferente de produzir, de comprar, de trocar, de vender, de consumir produtos, oferecer e receber crédito. O que move esta economia é o desejo de que não existam excluídos, que a riqueza produzida no trabalho seja partilhada e que todos tenham qualidade de vida. A Economia Solidária é também uma estratégica de desenvolvimento sustentável que considera todas as dimensões (econômica, social, cultural, ambiental, política, etc).
DESTAQUES DA PROGRAMAÇÃO:
Brasil de Fato comemora 1 ano de circulação
Em 2018 a programação da Feicoop contemplou o pré-lançamento do jornal Brasil de Fato/RS. De lá para cá, foram 24 edições, pulicadas em periodicidade quinzenal, com tiragem de 25 mil exemplares distribuídos gratuitamente em todo RS, fomentando “uma visão popular do Rio Grande do Sul, do Brasil e do Mundo” através de um noticioso produzido por trabalhadores para trabalhadores. Em 2019 novamente estaremos no evento, celebrando esse primeiro aniversário e reafirmando nossas páginas como um espaço de resistência e também de construção. Além da distribuição de uma edição especial do jornal para os participantes da feira, é aguardada a presença do músico Zé Martins para interpretar a canção especialmente composta em homenagem ao jornal.
Levante Popular da Juventude realiza acampamento
O Levante Popular da Juventude realiza em Santa Maria mais uma edição do seu acampamento estadual, trazendo como lema “Resistir e lutar: juventude nas ruas por um projeto popular”. A expectativa dos organizadores é reunir 400 jovens de todas as regiões do RS para debater os desafios da juventude diante da conjuntura política nacional. Serão três dias com espaços de debate, produção artística e cultural, oficinas diversas que contribuam para a compreensão de que as respostas para a complexidade do momento político que vive o Brasil dependem da organização popular. Além disso o método de organização do acampamento, com a divisão coletiva das tarefas, proporciona à juventude a experiência de protagonizar processos de mobilização e organização popular.
MST mostra a força da produção da reforma agrária
O Movimento dos trabalhadores rurais Sem-Terra (MST) estará efetivando mais uma edição do chamado “túnel da reforma agrária”, onde colocará em exposição e comercialização dezenas de itens produzidos nos assentamentos da reforma agrária no RS. Para os representantes do movimento, retornar à Feicoop é reafirmar o projeto de agricultura camponesa, a base de produção agroecológica, a diversidade para comercializar e alimentar o povo brasileiro. Também se colocará em foco a desconstituição dos programas voltados à agricultura familiar por parte do governo federal e a resposta dos movimentos populares do campo que reafirmam a resistência ativa em relação ao projeto de agricultura que se tenta impor.
MPA participa defendendo a bandeira da Agroecologia
Fomentando a participação de iniciativas camponesas no espaço da feira e demarcando presença ainda com o lançamento de dois livros durante a programação da Feicoop, o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) reforça a presença da bandeira da Agroecologia. A tradicional exposição e partilha de sementes agrícolas preservadas e multiplicadas pelos guardiões de sementes também terá espaço, assim como a comercialização de livros editados pelo Instituto Cultural Padre Josimo. A juventude também terá papel de destaque com a Caravana Nacional de Luta Camponesa Alexina Crespo, que está percorrendo as regiões do estado onde o movimento tem base e promoverá intervenções culturais ao longo de toda a programação e em diversos espaços da Feicoop.
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