Revista de Rádio Nº522 - 17 de agosto de 2023
Bloco 1:
Bloco 2:
INSTITUTO CULTURAL PADRE JOSIMO
PROGRAMA REVISTA DE RÁDIO
Produção e apresentação: Frei João Osmar
522º programa: 17 de agosto de 2023:
1- Resenha: Hoje vamos tratar sobre o sobre a 7ª Marcha das Margaridas que aconteceu nesta semana em Brasília, reunindo mais de 120.000 mulheres de todos os recantos deste Brasil. Eram assentadas da Reforma Agrária, Pequenas agricultoras, Ribeirinhas, Quilombolas, Indígenas, enfim, mulheres da Terra, das Florestas, das Águas unidas na luta por mais qualidade de vida para si e para toda a população Brasileira. Seguimos aqui o artigo de Letícia Chimini no site do jornal Brasil de Fato. No link abaixo a matéria completa.
As Margaridas, a fome e a luta contra a violência no campo | Opinião (brasildefato.com.br)
As Margaridas, a fome e a luta contra a violência no campo
Margarida Alves, Roseli Nunes e tantas outras e outros existiram, resistiram e suas existências são marcos históricos.
Letícia Chimini* Brasil de Fato | Porto Alegre (RS)
Prefiro morrer na luta do que morrer de fome (Margarida Alves; Roseli Nunes)
As camponesas são defensoras dos direitos humanos e, no Brasil, desenraizaram direitos para a totalidade da classe trabalhadora. Nas raízes da formação sócio-histórica do Brasil, o campesinato planta resistência, colhe direitos, mas também as várias formas de violências plantadas pelo Estado aliado ao capital. Alguns nomes são conhecidos e foram visibilizados pela história, outros tantos apagados. O nome das mulheres tem reconhecimento quando uma tomba lutando. Margarida Maria Alves foi dessas mulheres, cuja luta pelos direitos trabalhistas e pela reforma agrária se fundiu com a própria vida. Sua atuação se tornou alvo de ameaças e perseguições por parte de proprietários de terras e grupos poderosos contrários à luta coletiva que fazia. Ela foi assassinada em 12 de agosto de 1983, em frente à sua casa por pistoleiros contratados.
:: Mulheres gaúchas embarcam rumo à 7ª Marcha das Margaridas ::
Roseli Nunes também foi uma lutadora pela reforma agrária e também foi assassinada. Sua vida foi ceifada durante um protesto de pequenos agricultores e agricultoras no Norte do RS. Margarida e Roseli tinham muitas coisas em comum, haja vista que a luta por terra, pelo território, por justiça e direitos anda pari passu na luta contra a fome. Nessa data, conclamamos para reflexões que convergem a fome, a luta por terra e território (recursos naturais) e, consequentemente, para darmos visibilidade às formas violentas e desigualdades estruturais que decorrem dos conflitos na luta de classes. Essas, nos remetem para a formação de um país que assentou suas estruturas na exploração, expropriação e que transitou todas as fases do Brasil desde Colônia, do Brasil Independente, da Velha República, da República Nova, da Ditadura Civil-Militar, chegando ao Brasil atual. Dessa herança, que se tornou projeto de sociedade, permanecem, tanto a subordinação da produção agrícola aos interesses exportadores, quanto os componentes não capitalistas nas relações de produção e nas formas de propriedade, que são redimensionadas e incorporadas à expansão capitalista, territorializando o capital e monopolizando a terra. Nessa dinâmica, a violência se apresenta como uma dimensão fundamental para a compreensão do contexto brasileiro e contribui para as análises da relação entre acumulação e a manutenção do poder das classes dominantes, que se reflete até os dias de hoje, na forma violenta como esse país foi invadido, saqueado, expropriado, com profundas desigualdades no acesso à terra, no genocídio dos povos originários, na escravização do povo negro, na qual o capitalismo desenvolveu particularidades de um capitalismo dependente, com primazia da superexploração da força de trabalho. Marx (1984) já apontava em sua obra a violência como uma potência econômica presente no processo de acumulação capitalista. Seguindo pelas raízes históricas do Brasil percebemos que a violência estruturou e estrutura um contexto de domínio das elites agrárias, conservadoras, escravista e coronelistas, quase um retrato do Congresso Nacional brasileiro. Marini (2000) destacou a importância da exploração do trabalho excedente para a acumulação capitalista nos países dependentes, bem como a utilização de mecanismos de coerção e violência para garantir a manutenção dessa exploração. Bambirra (2013), apontou a violência como forma de reprimir as lutas e resistências da classe trabalhadora, garantindo a manutenção do poder das classes dominantes. Para Castelo (2021), a violência é uma potência econômica que permite ao capitalismo dependente obter vantagens econômicas e manter sua dominação. Essa violência se manifesta de diferentes formas, como a violência institucionalizada pelo Estado, a violência das classes dominantes sobre as classes subalternas e a violência simbólica presente na cultura e nas relações sociais, que vai transversalizar.
:: Por que Margarida Alves não foge da luta? Legado histórico segue em Marcha há 40 anos ::
No período de redemocratização, a partir de 1988, ocorre uma reorganização do capitalismo no campo brasileiro que pactua latifundiários com a indústria transnacional, com a mídia, com Estado e com o capital financeiro. Essa composição fortaleceu as relações de poder que articulou terra, as empresas transnacionais e a mídia hegemônica, costurando esse enredo. Por fim, tudo isso com fomento do Estado, através de políticas públicas e de alteração da legislação para estar em conformidade com o projeto pretendido. O Agro não é POP, o Agro é morte! A insistência da mídia hegemônica, que fez sua fortuna na ditadura militar, engana propositalmente a sociedade brasileira quando coloca na mesma propaganda o pequeno agricultor, a camponesa e o latifundiário, no intuito de desmobilizar a identidade camponesa e colocar em um mesmo contexto latifundiários e a agricultura camponesa familiar. Engana o povo quando utiliza a floresta e as monoculturas na mesma mídia para pintar de verde o que está manchado de sangue. O Agro não é top, o agro é veneno na mesa. O Agro é fome! Cabe ainda, inferirmos sobre os números divulgados pelo censo agropecuário que denuncia desde 2006 que o agro (latifúndio) possui cerca de 70% das terras agricultáveis, utilizam 70% dos recursos públicos para produção e produzem apenas 30% da comida que vai para a mesa do povo brasileiro (BRASIL, 2009). O restante são commodities, mercadoria em sua forma bruta. O Congresso Nacional brasileiro é a imagem que incorpora os interesses das classes dominantes, com ênfase nas bancadas da bíblia, do boi e da bala. O agronegócio brasileiro foi forjado na escravização do povo negro, no cercamento das terras e das águas, no genocídio dos povos originários, na destruição ambiental, na subserviência e subalternidade econômica, política, social e cultural aos países centrais, na grilagem de terras, no extrativismo predador e na produção de commodities em detrimento da produção de comida. O sociometabolismo do capital faz gerar mais violências sobre a classe trabalhadora em um Estado que tem o controle das armas e vimos a cada golpe sobre a jovem democracia, ainda que burguesa, armas a serviço das milícias, da pistolagem e nas mãos do ‘cidadão de bem’. A violência que enfrentou Margarida Alves é estruturante da formação brasileira. Margarida Maria Alves foi a primeira mulher a presidir o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Alagoa Grande, por 12 anos, em plena ditadura militar brasileira, realizando diversas denúncias e judicializando ações trabalhistas. O seu caso é representativo do contexto generalizado de ataques e assassinatos de defensores e defensoras de direitos humanos no Brasil, pois foi assassinada em sua residência, na frente de toda a comunidade, vizinhos e familiares por um indivíduo que não fez questão de esconder seu rosto. A violência que matou Margarida Alves e Roseli Nunes segue ceifando vidas, ameaçando sujeitos da história e criminalizando quem ouse alterar a ordem hegemônica dos privilégios no Brasil. Não é só a bala de uma arma que provoca a morte, a negligência do Estado mata tanto quanto e a conivência mata ainda mais.
:: Comissão Camponesa da Verdade lança perfis nas redes sociais para reforçar a luta pela memória ::
Margarida Alves, Roseli Nunes e tantas outras e outros existiram, resistiram e suas existências são marcos históricos. Suas vidas e suas lutas deram origem e são inspirações para marchas, assentamentos, para lutadores e lutadoras do campo, das florestas e das águas. Todos os anos, nessa data, Margaridas partem de todos os cantos do Brasil e seguem em marcha até a capital do país para denunciarem o agro e as violências e ataques sofridos dentro de seus próprios territórios. Não deve restar dúvidas quanto à importância da luta do povo organizado por uma reforma agrária popular, pois a terra conquistada se torna território ocupado que não se concretizaria sem a pressão e a mobilização do campesinato. Essas conquistas extrapolam fronteiras e regiões e convergem em força para a totalidade da luta da classe trabalhadora, que mobilizada luta contra a miséria nas cidades, contra o racismo que estrutura as violências contra o povo negro e que condena à morte crianças e jovens nas periferias, contra a desigualdade de gênero que chancela a certeza da injustiça. Nesse período de lutas e que marcham camponesas de todos os cantos do Brasil, que possamos nos tornar Margaridas na luta pela terra liberta e pela emancipação humana. * Letícia Chimini é assistente aocial, mestra em Desenvolvimento Regional (Unisc), doutora em Serviço Social (PUC-RS), compõe a coordenação da Campanha Permanente Contra a Violência no Campo, militante do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA).
2- Testemunho/entrevista: Hoje vamos ouvir o testemunho de Nalini M. Castilhos que nasceu em Sobradinho no ano de 1987, mas mora e trabalha em Agudo desde 2005. Trabalha como Operadora de Áudio e apresentadora de programa numa emissora de rádio e no Magistério Municipal, como professora das séries iniciais. É Licenciada em Educação no Campo e tem graduação em geografia. Na entrevista ela nos fala da sua vida, sobre a Arte e a Cultura em Agudo e região sobre sua participação na SemeArt, evento artístico cultural que acontece anualmente nas dependências do Seminário Franciscano de Agudo, que neste ano realiza sua VII edição e sobre a importância de tal acontecimento para o bem da cultura local e de toda a comunidade agudense. 3- Música: Sem Medo de Ser Mulher, com Zé Pinto; 4- Fotos: Da internet – Marcha das Margaridas 2023.