Revista de Rádio Nº 541 - 28 de dezembro de 2023



Bloco 1:

Bloco 2:

INSTITUTO CULTURAL PADRE JOSIMO 

PROGRAMA REVISTA DE RÁDIO

Produção e apresentação: Frei João Osmar

541º programa: 28 de dezembro de 2023:

1- Resenha: Hoje vamos tratar sobre a luta dos Movimentos Populares e da Sociedade organizada contra o chamado “Pacote do Veneno” que a Bancada do Agronegócio quer implementar a qualquer custo. Vou seguir aqui as reflexões de Emiliano Maldonado publicadas no site do jornal Brasil de Fato RS nesta semana. Veja a íntegra do artigo clicando no link abaixo:

A luta contra o Pacote do Veneno continua! | Opinião (brasildefators.com.br)

‘É preciso seguir mobilizados, demonstrando o dever constitucional do STF proteger nossos direitos fundamentais’ Emiliano Maldonado. “Os vetos são uma pequena vitória, mas a luta, a luta segue, pois precisamos que seja reconhecido que essa nova lei é amplamente inconstitucional!” – Shutterstock

No raiar do dia 28 de dezembro de 2023, foi publicado no Diário Oficial a Lei nº 14.785/2023, que: Dispõe sobre a pesquisa, a experimentação, a produção, a embalagem, a rotulagem, o transporte, o armazenamento, a comercialização, a utilização, a importação, a exportação, o destino final dos resíduos e das embalagens, o registro, a classificação, o controle, a inspeção e a fiscalização de agrotóxicos, de produtos de controle ambiental, de seus produtos técnicos e afins; revoga as Leis nºs 7.802, de 11 de julho de 1989, e 9.974, de 6 de junho de 2000, e partes de anexos das Leis nºs 6.938, de 31 de agosto de 1981, e 9.782, de 26 de janeiro de 1999. O chamado “Pacote do Veneno” havia sido aprovado após um grande “acordão” no Senado federal, no final de novembro, e aguardava sanção presidencial. Nas últimas semanas esse grave retrocesso legislativo enfrentou forte oposição de diversos setores da sociedade, que se mobilizaram nas redes em defesa do veto presidencial ao PL. Inclusive, o Instituto Nacional de Câncer (INCA), o Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH) e o Ibama pediram vetos ao presidente Lula. Desde 2018, diversas entidades como Anvisa, Ibama, Ministério Público do Trabalho, Ministério Público Federal, e até relatores da ONU e da CIDH se manifestaram contra o Pacote do Veneno. Recentemente, técnicos da Anvisa chegaram a dizer que o Pacote do Veneno coloca ‘vidas brasileiras em risco’. Abrasco e a Associação Brasileira de Agroecologia também se manifestaram pelo veto.

Diante dessa forte mobilização social e científica, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva impôs 14 vetos ao Projeto de Lei 1459/2022. Vetos importantes que demonstram que as críticas e alertas estavam adequadas, porém, insuficientes. Ou seja, os vetos são fruto das intensas mobilizações, críticas e inconstitucionalidades apontadas por especialistas e movimentos populares sobre os riscos ambientais e à saúde pública relacionados à aprovação açodada do Pacote do Veneno e ao atual modelo de produção do agronegócio. Contudo, apesar do reconhecimento de que esses vetos são reflexo da ampla rejeição da sociedade civil a essa mudança orquestrada pela bancada ruralista no congresso, pouco temos a comemorar neste final de ano. O que se verifica de uma análise atenta do inteiro teor desta nova Lei é que seus verdadeiros objetivos não são promover uma modernização do atual marco regulatório, pelo contrário a legislação da década de 80 era muito melhor do ponto de vista da técnica jurídica e agrícola. Em verdade, o novo texto é confuso, fraco e inconstitucional, já que seu verdadeiro objetivo era o desmonte completo do sistema tripartite vigente, que buscava abarcar o olhar dos órgãos de agricultura, da saúde e do meio ambiente. Parte desse retrocesso, inclusive, foi vetado pelo executivo. No entanto, como a visão de centralizar nas mãos do “agro” (Mapa) consta em todo o texto, somente um veto total seria capaz de extirpar os riscos de deixar “a raposa cuidando do galinheiro”.  

Outro aspecto gravíssimo que salta aos olhos refere-se à retirada dos critérios proibitivos (câncer, mutagênese, desregulação hormonal, má-formações fetais, etc.) que existiam expressamente na legislação anterior e que na nova sequer são mencionados. Tal inconstitucionalidade material coloca em risco os direitos à vida e à saúde, previstos no caput dos art. 5º e art. 6º da Constituição Federal de 19888, pois retrocede significativamente na proteção à saúde e ignora os alertas do Inca, Abrasco, assim como as dezenas de pesquisas científicas recentes que apontam a relação e efeitos dos agrotóxicos na ampliação dos casos de câncer e autismo. Outro aspecto grave refere-se à lógica colonial e dependente que estrutura as cadeias produtivas das grandes corporações agroalimentares sediadas nos países do Norte Global, pois segundo o novo art. 17 observa-se que produtos destinados para a exportação não necessitarão adotar os mesmos padrões de qualidade e proteção, tendo procedimentos simplificados. Esse aspecto, em verdade, resultará nas chamadas zonas de sacrifício, nas quais se coloca em risco nossos trabalhadores, nossa natureza e bens comuns para servir como espaços de produção química destinada para outros países do sul global. A nova lei, portanto, abre margem para que sejamos palco de um desastre químico aos moldes de Bhopal. Será que não vamos aprender com os crimes da Vale e da Braskem?! Se era para modernizar o marco regulatório, não é chegada à hora de proibir os agrotóxicos banidos? Até quando seguiremos consumindo substâncias químicas proibidas na União Europeia e aceitar ser envenenados? Poderia seguir numerando os vários retrocessos, seja porque a nova lei não observa os princípios da precaução e da vedação ao retrocesso socioambiental e climático, ambos atrelados ao direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, previstos no caput do art. 225 da Constituição, seja pelos graves retrocessos na proteção à saúde, aos direitos reprodutivos das mulheres, das crianças e adolescentes, ao direito humano à alimentação adequada, direitos do consumidor da nossa população.

No entanto, para além deste texto, essas inconstitucionalidades latentes serão demonstradas técnica e cientificamente por várias entidades da sociedade civil que pretendem questionar perante o Supremo Tribunal Federal a aprovação dessa nova lei. Caberá novamente ao STF evitar que a boiada siga passando e que a ganância da bancada ruralista e das corporações transnacionais prevaleça sobre os direitos humanos, econômicos, sociais e ambientais que estão sendo vilipendiados pela aprovação do “Pacote do Veneno”. Porém, como sabemos o direito não é algo dado, ele emerge das lutas sociais, ou melhor, como diria Lyra Filho: o Direito não é; ele se faz, nesse processo histórico de libertação (…) nasce na rua, no clamor dos espoliados e oprimidos”. Por isso, sabemos que precisamos seguir mobilizados e em luta, demonstrando o dever constitucional do STF proteger nossos direitos fundamentais e, sobretudo, de evitar que o negacionismo científico e que o modelo agrícola vigente se alastre completamente e destrua o que nos resta de territórios, fontes de água e de produção de alimentos sem veneno. Assim, os vetos são uma pequena vitória, mas a luta, a luta segue, pois precisamos que seja reconhecido que essa nova lei é amplamente inconstitucional! Além disso, o atual governo precisa dar sinais mais claros de que irá promover políticas públicas que estimulem a reforma agrária e a agroecologia, as quais são a forma mais eficiente e ecológica de produzir alimentos saudáveis para toda a sua população, sob pena de que o discurso esverdeado proferidos nos foros internacionais caia em mera retórica ambientalista e que as forças sociais que o elegeram percam a esperança de que estamos caminhando para um novo tempo, tempo de avançar! 

 2- Testemunho/entrevista: Hoje vamos ouvir o testemunho de  Idésio de Oliveira que nasceu no ano de 1964 na cidade de Morro da Fumaça, SC. Ele é formado em Enfermagem, profissão que exerceu na maior parte de sua vida profissional. Nos anos 1990 migrou para Porto Alegre, RS onde fixou moradia e trabalhou profissionalmente até os dias de hoje, desenvolvendo paralelamente atividades nas periferias da Grande Porto Alegre, especialmente na prevenção e tratamento da AIDS numa ONG conhecida como GAPA. Idésio é também poeta e escritor. Vale a pena ouvir seu belo testemunho de vida.                                                                       3- Música:  Coração de Estudante, com Milton Nascimento;

4- Fotos: Da internet –Idésio de Oliveira: