“Criminalizar uma mulher vítima de estupro e abuso é violentá-la novamente”, afirmam Padres da caminhada

22 de junho de 2024

Coletivo formado por sacerdotes católicos emitiu nota se posicionando contra o PL dos estupradores

 

Marcos Antonio Corbari
Brasil de Fato | Porto Alegre (RS)
 

O coletivo Padres da Caminhada, formado por 461 diáconos, padres e bispos da Igreja Católica emitiram uma nota pública na última quarta-feira (19) posicionando-se de forma contrária ao Projeto de Lei 1904/2024 que ora tramita no Congresso Nacional e que ficou popularmente conhecido como PL dos Estupradores.

A proposta apresentada na Câmara pelo deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) equipara a interrupção da gravides realizada após a 22ª semana de gestação em casos de estupro ao crime de homicídio. Na prática, o PL prevê que a pena para a mulher que interromper a gravidez seja mais dura que aquela a ser imposta ao homem que a estupra.

“Em consonância com os sentimentos da maioria do povo brasileiro, especialmente das nossas irmãs mulheres, reprovamos, repugnamos e nos opomos veementemente ao PL 1904/2024”, afirmam os subscritores da nota. “Obviamente, não somos a favor do aborto, somos sim contra a substituição de políticas públicas por leis punitivas às vítimas de estupro e abuso, imputando-lhes um crime seguido de pena maior do que o dos estupradores”.

Em seus argumentos o coletivo traz citações ao ministro do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso, que afirmou em entrevista que “qualquer pessoa deve ser contra o aborto, o papel do Estado é evitar que ele ocorra e amparar a mulher que queira ter o filho e esteja em condições adversas”.

Relembram também as palavras de Dom Angélico Sândalo Bernardino, que afirmou “Simplesmente punir a mulher sem discutir com profundidade uma situação tão complexa é uma leviandade. É uma precipitação legalista. É querer resolver pela lei um problema muito mais amplo e vasto”.

Os Padres da Caminhada afirmam que não será construída uma sociedade justa, humanizada e humanizadora com base em leis punitivas. “Seremos um país humano e humanizador somente se partirmos da solidariedade e da nossa compaixão e se a nossa justiça ultrapassar a dos fariseus”.

Apelam aos legisladores que sejam sinceros e tenham discernimento para perceber a condição sofredora da imensa maioria do povo brasileiro, particularmente das mulheres, e abraçá-las e protegê-las com a mais profunda humanidade. “Que tenham sensibilidade para perceber que nossas ruas estão ensanguentadas e nossa infância abandonada e, consequentemente, não elaborem projetos eleitoreiros perversos, brincando com vidas humanas pobres, desvalidas e invisíveis”. Por fim denunciam: “Criminalizar uma mulher vítima de estupro e abuso é violentá-la novamente”.

 

Quem são os Padres da Caminhada?

O coletivo denominado “Padres da Caminhada” é um grupo, reunidos desde o encontro sul brasileiro de Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) em 2019. Atuando em consonância com o pensamento do Papa Francisco e trazendo para a atualidade as reflexões e proposições da Teologia da libertação. “O que queremos é dar visibilidade aos sinais do Reino anunciado e revelado por Jesus de Nazaré, na radicalidade da opção pelos pobres e descartados da nossa sociedade. Temos consciência de que as nossas causas valem mais que nossas vidas”, afirmam em documento publicado no início do ano, em seu segundo encontro presencial.

 


Leia a íntegra da Carta dos Padres da Caminhada no site do Instituto Humanitas, da Unisinos.